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domingo, 9 de outubro de 2011

João e as draconídeas...


Ontem à noite, as draconídeas rasgavam o céu em pedaços, deixando marcas cor de prata na imensidão negra do espaço. Apareciam em todas as direcções de forma envergonhada e faziam traços aqui e ali desenhando a via láctea, enfeitada anteriormente pelas estrelas. O espectáculo para quem quis ver, era mágico. 

Correndo de um lado para o outro no seu casulo, João mergulhava no fantástico de cada vez que saia a porta ou espreitava da varanda.
- Acabei de ver uma, é tão bonito. 
E, permanecia, impaciente a olhar o céu, a quem nunca tinha dado muita atenção.

A Lua, quase cheia, defendia as aparições soltas e espaçadas no tempo, com a sua luz branca e fixa que enchia o céu de luar e o João de preses para que se apagasse só por um bocadinho, para poder assistir em paz e na repleta escuridão aquele espectáculo pela primeira vez e  de forma intensa, viajando, no espaço. Mas a Lua não o ouvia. Estava demasiado concentrada, lá em cima no seu pedestral, a tomar conta do céu.

Acabou por desistir e abrir o mais possível  os seus grandes olhos, redondos, de azeitona, negros. Tapara os ouvidos para não ouvir a luz da lua teimosa  que lhe roubava a concentração e deitou-se no chão a olhar o esplendor da natureza, aquele tecto carregado de pontos minúsculos de luz, mais ou menos intensos conforme a distância a que se encontravam da Terra e questionava-se, curioso.

- Porque nunca dei atenção ao céu?, - Quem são estas migalhas luminosas?
- O meu avô!, A minha avó?!, A minha mãe?!!!

João, não percebera que enquanto formulava para dentro de si todas aquelas perguntas, que a Estrela Polar  que estava mais perto de si que todas as outras e mais atenta,  descera até à sua varanda, silenciosa e lhe oferecera o seu colo,  onde João aconchegava a cabeça. Afagava os cabelos de João com uma das mãos e com a outra permanecia agarrada ao céu, a onde pertencia. Por aqui não havia solavancos de condução como nos autocarros, para que pudesse cair, mas havia uma profecia milenar, que dizia, que no dia, em que soltasse as duas mãos lá de cima, cairia redonda na terra e perderia a vida para sempre. Gostava demasiado de viver para morrer, por isso tinha cuidado quando chegava perto de nós,  as pessoas, os humanos. Permaneceu de braço no ar o tempo todo, numa posição deliciosamente desconfortável. Eu vi, estava lá também.

João, por seu lado, aconchegava-se cada vez mais ao conforto de um colo maternal, que quase já tinha esquecido e que lhe sabia tão bem recordar. Ficaram por ali, encetando um silêncio que nunca mais terminou ao longo da vida dos dois...

1 comentário:

  1. A magia das draconídeas...a magia das palavras...a magia de quem as escreve!Bjs

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alfa diz: