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quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Vida morna...de Fernando Pessoa


 


Ainda pior que a convicção do não, é a incerteza do talvez, é a desilusão de um quase!
É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi.
Quem quase ganhou ainda joga, quem quase passou ainda estuda, quem quase amou não amou.
Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances   que se perderam por medo,  nas ideias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no Outono.
Pergunto-me às vezes o que nos leva a viver uma vida morna.
A resposta eu sei de cor, está estampada na distância e na frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos bons dia, quase sussurrados.
Sobra covardia e falta de coragem para ser feliz.
A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai.
Talvez fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor.
Mas não são.
Se a virtude estivesse mesmo no meio – termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco – íris em tons cinza.
O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.
Preferir a derrota prévia à dúvida da vitoria é desperdiçar a oportunidade de merecer.
Para os erros há perdão, para os fracassos, chance, para os amores impossíveis, tempo.
De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar a alma.
Cujo o fim é instantâneo ou indolor não é romance.
Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar.
Desconfie do destino e acredite em você.
Gaste mais horas realizando, que sonhando…
Fazendo que planeando…
Vivendo que esperando…
Porque, embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu.

Fernando Pessoa


Obrigada Cristina pelo envio do poema fantástico, que não conhecia, bjinhos.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O ensaio...




Numa luta desigual, em que a vontade mental teima para que viva e a morte me quer levar, procuro desesperadamente uma enseada onde possa largar o meu corpo, aconchegado à terra e fazer livre de uma vez por todas a minha alma, que nunca aprendeu a viver de outra forma.

Sinto um curto-circuito interior que me arrepia, que me faz estremecer... e picadas ao de leve por todo o corpo, como se um formigueiro me atacasse e me corroesse por dentro, sem mágoa, sem pena de me ver partir. Perco as forças a cada dia, não consigo equilibrar o esqueleto, este pequeno conjunto de ossos que foram crescendo comigo e perdendo a esperança aos poucos de um dia viver hirto, em harmonia com a vida, onde as pessoas são felizes ao lado umas das outras, num país brilhante. Esse momento,  já passou e eu quase nem dei por ele. A curva é agora descendente.

Tenho medo de tropeçar, cair e desordenar a ordem...
Assisto de fora a um caos interior, lento, que sinto. O meu cérebro troça e não acompanha o desmoronar do corpo que me deram...

Acabei de fazer um acordo com a Vida. Morro agora e volto a nascer amanhã, num outro corpo "novinho em folha", forte e são, onde a energia dominará todas as minhas células e, em troca, prometo tomar conta dele muito melhor, que do primeiro que tive. Não terá vícios, terá consciência de que não é indestrutível, saber-se-à posicionar correctamente em cada momento, não exercerá esforços em excesso nem em defeito, e talvez assim o consiga convencer a viver eternamente, com o mesmo esplendor de quando alguém o trouxe ao mundo.

Dei cabo dele, gastei-o, abusei dele, fiz do meu corpo um carrasco, o meu próprio carrasco... por desconhecimento, por inocência e ingenuidade. Ao olhar para os demais seres vivos entendi-me em tudo melhor que eles. Mais inteligente, mais forte, mais tudo...

...e, o carrasco tomou conta de mim. Fui amarrada, chicoteada, apedrejada, taparam-me a boca, quase não respiro...apenas, um fio de ar me percorre as veias e não me deixa morrer no verdadeiro sentido da palavra...

Não aguento o que não quero, o que não gosto, não aguento mais nada...
 
Vou aconchegar-me aqui, nesta curvatura da costa, reentrância aberta na direcção do mar ladeada por dois promontórios. Fecho os olhos e vejo-o a ele, o mar e vejo-me a mim, a ir embora...

...
Antes de voltar de novo à vida, amanhã, explicam-me, que a minha existência anterior...
afinal,  não passava de um Ensaio...

...A vida só será plenamente vivida quando voltarmos pela segunda vez...Aí sim,... Vai começar o ESPECTÁCULO...

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O tempo que o tempo tem...reflexão


 O tempo que o tempo tem...


O tempo tem tempo para tudo,
...nós não

O tempo tem tempo para nós,
para ele,
e ainda lhe sobra tempo para os outros,
...nós não

O tempo, gasta o seu tempo em tudo quanto leva tempo,
...nós não

Ao tempo sobeja até tempo
...a nós, não

Em que gastamos nós afinal o tempo??!!!
sem ser em tempo e no tempo que gastamos..

...gastamos o que não temos... tempo

tempo é espaço...

gastaremos nós o tempo e o espaço!!!!!!???

Estou sem tempo...

e sem espaço vos escrevo,
na esperança de que o meu tempo, substancie o gastar do meu próprio espaço

e, sem tempo, gasto o espaço que não tenho...

porque, não tenho tempo.



Penso:
"Esta utopia do progresso ininterrupto"
...abençoado tempo que gastei, em companhia da amizade. O espectáculo terminara, o teatro fechara as portas, o público todo tinha saído e nós sozinhas num cenário fantástico de vazio...trocavamos palavras perdidas, no teatro...pela noite fora.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Hoje sei, porque Sinto.


Lá longe, um dia, nasceu uma menina...

Com pele de recém-nascido, quero dizer suave, elástica e de coloração entre o rosa e o vermelho, consoante a ascendência racial que se trás, era feita de pele e osso, e cresceu aos olhos de todos quantos por ela passavam sem a ajuda de ninguém. Tinha uma casa enorme, a Rua, e que era sua. Vivia as maiores aventuras da sua vida, nessa casa grande.

Atravessou batalhas, protagonizou duelos, brincou aos cowbois, com carros e bonecas de corrida, plantou sonhos, sofreu desilusões, amou isto e aquilo e deixou de amar, mas não foi por isso que deixou de gostar daquela casa grande, onde tudo encontrava e tudo a encontrava a ela...

Ainda criança pequena, leu algures num livro qualquer deixado pelos avós maternos, uma história. Uma história de uma menina que tinha nascido lá longe, um dia, sem pele, ...o que a deixava perplexa. Não conseguia imaginar o corpo de um ser humano, sem ser revestido por pele.

Na história que o avô lhe lia todas as noites... e, que, de tanto a ouvir a fixou, sem nunca mais precisar de olhar para as letras impressas senão apenas para as imagens coloridas, todas as pessoas tinham pele, excepto aquela menina. A tez era determinada pela raça, as marcas eram determinadas pela vida, mas todas as pessoas tinham pele. Composta por três camadas de tecidos, Epiderme, Derme, Hipoderme, que correspondiam a cerca de dez a quinze por cento do seu peso corporal. 

A pele tem uma função determinante no corpo humano, é um revestimento que protege o organismo da entrada de substâncias nocivas e evita a evaporação excessiva de água, causadora da desidratação. A história que o meu avô me contava todas as noites era bonita, mas não se desprendia do princípio ao fim da fisionomia humana e dos aspectos científicos, nem do seu objectivo pedagógico. 

- Esta história não acaba bem - dizia. 

O meu avô, sempre que chegava ao fim do livro, continuava a história. Fechava o livro sobre o colo e continuava. Esta, era a parte que eu mais gostava. Era fantástico ver o brilho dos seus olhos e a certeza de me dar o melhor de si e do que a vida lhe tinha ensinado.  Para ele, aquela história devia continuar, porque havia outras caracteristicas muito importantes sobre a pele que eu devia aprender, convicção que hoje partilho, inteiramente. E, num tom grave, determinado e ao mais tempo carinhoso dizia: 

- Meu neto, A nossa pele, é a fronteira entre o nosso mundo interior e o Mundo...Ficava à espera, numa pausa prolongada, e em duas ou três vezes que me davam para respirar e expirar, que eu dissesse alguma coisa, ...mas eu não sabia o que dizer. Atenta e expectante esperava que continuasse. E, começava a dissertar sobre o assunto, dava à história um final de afectos, de sentidos sentidos...

- Meu anjo, Apesar de todas as pessoas terem pele, como aquela menina que nasceu lá longe, um dia, há um outro tipo de pele, que não sei quantas camadas tem, que é a nossa fronteira, aquela onde vinculamos os afectos, os sentidos sentidos. Essa, é a mais importante de todas. Impermeabiliza ou não o que não gostamos e não queremos, ou o que gostamos e queremos, seja de fora para dentro ou de dentro para fora, seja do nosso mundo interior para o Mundo ou do Mundo para o nosso mundo interior. Quem não tem o corpo revestido por este tipo de pele, não tem fronteiras, logo não sente.

E, ficava calado...deixava-me naquela incógnita imensa a pensar o que quereria dizer com aquelas palavras, que me pareciam tão sábias sem as entender. Demorei alguns anos.

Hoje sei, porque Sinto...na pele.


1º Aniversário

Prémio Dardos 



Este prémio  foi um presente dado pelo Quicas, um dos meus seguidores e por quem tenho a maior estima e apreço. Obrigado, pelas muitas palavras que deixou no meu blog tantas vezes. Um beijo.
http://euquicas.blogspot.com/

Como contrapartida deste prémio, como devem saber, é com muito gosto que, mais uma vez, transcrevo os seus fundamentos e regras: 

«O Prêmio Dardos é o reconhecimento dos ideais que cada blogueiro emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc... que em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, e suas palavras.

Esses selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre os blogueiros, uma forma de demonstrar o carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web».

Estas são as "regras" (acho que não há penalização para os eventuais incumpridores...!):

- Exibir a imagem do Selo no Blog
- Exibir o link do blog que você recebeu a indicação
- Escolher 10, 15 ou 30 blogs para dar a indicação e avisá-los.

De seguida, partilho-o com todos os meus amigos e leitores destacando, hoje, entre eles, os seguintes, sem qualquer ordem de preferência, pois todos me merecem igual distinção: 

domingo, 31 de outubro de 2010

Meteorologia de uma frente...



(Esta é uma história de frente a frentes...)

Frentes frias, frentes quentes,

que disputam o ar
que dominam, ou se deixam dominar


Na dianteira,
uma massa de ar quente em movimento,
Frente quente
frente ardente
frente urgente


sobre a cauda,
um ar frio, relativamente denso, imenso
que se deixa dominar pelo ar quente, mente
De onde nasce uma larga faixa de nuvens
Sem penugens

Antes, cirrus, cirrostratus, altoestratus,
...chuva fraca, persistente
estratus, nimboestratus
...Frente quente


Nevoeiro esparso
Frente quente

que se desloca lentamente
e se deixa agarrar pelo ar frio
ser sombrio
ser de aço

Frente fria
Frente oclusa
sem magia
obtusa

sem movimento,
por momento

Frente estacionária,
embrionária

Frente quente
transparente,
zona de transição
sem senão,

onde uma massa de ar quente e húmido
substitui uma massa de ar frio
sem prurido
sem pio

Precipitação,
sim e não

ar quente menos denso,
penso

transformado em massa sobe inteiro,
como guerreiro

por cima da massa de ar frio,
vigio

Precipitação
sim ou não

Passou.

Cumulus de bom tempo,
contratempo

Eleva-se a temperatura
antes da sua chegada,
velada

Cirrus
Cirrocomullus
Cumulonimbus
TROVOADA

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Bird Girl...Quetzal


 
É com vontade que GRRRIIITTOOOO,
que decido,
que quero voar

Tornar-me dona de mim por inteiro
sem amarras,
que me fixem,
que, de invisíveis me amarram,
me estancam e me despedaçam aos bocados...


Estou de saída de um mar denso, frio
calado, ...parado, sempre no mesmo sítio,
...não se move...não tem correntes...
nem frias nem quentes

que cristalizado, me afogou de todos os lados,
sem remorsos nem culpa...

Saio pelo meu pé,
viva,
deste Mar, em que mergulhei quando criança sonhadora
e onde permaneci sem respirar

De pulmões cheios de água
sem réstia de ar
Saio,
roxa,
estonteada, cambaleante...


Foi debaixo de água,
no silêncio
que me cresceram as asas,
sem que ninguém percebesse, que elas só servem para voar

...achavam, que enquanto molhadas, de molhadas não passavam...

Surpreendi-os...

Um dia os raios de Sol atravessaram o mar
e elas secaram,
ganharam vida e esplendor

Eram grandes, brancas,
e leves...

Emergi na direcção do Céu
num esvoaçar sóbrio e sereno,
planei...

Planando, dei a volta ao mundo,
adquiri uma outra perspectiva,
vendo tudo de cima

as coisas deixaram de ter a dimensão que lhes dava,
tudo era muito mais pequeno...

...grandes,  grandes, eram apenas, o céu e a terra
esses sim,
a perder de vista...

Good bye..... Bird Girl, Quetzal...


*Quetzal, ave trepadora da América Central, que morre quando privada de liberdade.

domingo, 17 de outubro de 2010



(depois, de terminar de ler "Livro", do José Luís Peixoto)

Do lado de lá, a casa estava vazia... Ao longe, apenas se ouvia um rádio velho a tocar uma música nova e vozes que mal se ouvem, mal se interpretam porque sumidas se esgueiram por caminhos de multidão sem rumo, vindas da televisão acesa para ninguém ver ....e, já noite, acabou deitado,... depois de cumprir um ritual com insistência...Em vez de serenar através das palavras que lia e do amor transmitido por elas, rompia numa raiva cega, desmedida, desencorajada apenas pelo sono e pelo cansaço de mais um dia...

...Ilídio, pai do Livro...a poucas folhas do fim, deixava para trás Adelaide...

Livro,  educado pela mãe de Lenine, recordava com dor a ausência de um Ilídio, pai, apaixonado e nunca presente, que por partidas do destino e do que ficou por dizer, e que foi tanto, nunca soubera senão com os olhos expressar o quanto a amava e o quanto queria partilhar com aquela mulher,...tudo...

"Essa, foi a primeira vez que os vi juntos. Nessa manhã, a minha mãe tinha quase setenta anos."...a história tinha tido início quando a mãe de Ilídio lhe colocara um livro nas mãos e o deixava à deriva, sentado no cruzeiro à espera da Vida. Cresceu sozinho no silêncio e acarinhado ao longe, à distância. 

Adelaide acompanhou o destino, relatado pelo Livro, escritor, pág. 234....gosto...de...ti. Pág.235, ...não..me...conhece...

A duas páginas do fim, batem à porta do quarto a cada batida no teclado..."É a minha mãe. O Ilídio está ao seu lado. Estão calados a olhar para mim. Não sei ao que vêem......Eu sou um menino sem voz, podem fazer de mim o que quiserem...: - Já sabes o que tenho para te dizer. A minha mãe agarra a mão de Ilídio com toda a força, passa os dedos por dentro dos dele. As suas mãos formam um polvo receoso....Adelaide abraça o filho e Ilídio dá-lhe um aperto de mão ", a distância mantida entre pai e filho deixa-o descontraído.... se de outra forma fosse, não saberia como comportar-se apesar da idade....há coisas que só de pequenino se aprendem, se treinam, para podermos em mais velhos usufruir dessa aprendizagem.

Cosme, permanecia atento, queria guardar nas memórias o relato de tudo, queria testemunhar a  reacção de Ilídio. Livro continuava a escrever...


Obrigado Luís, ...agradeço-te por me teres trazido até à última página e por seguir contigo até à última palavra...


segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Estranhos hábitos...


Atendi como é habitual, dizendo: 
- Estou, estouuuu.....Alôooo...

...do outro lado o silêncio era absoluto, ninguém respondia., e eu continuava,... alôoooo, ssiiimmmm...
espaçados, ouviam-se sons estranhos de uma orelha a roçar o auscultador, seguido do som de um carro que passava, testemunhando o alguém do outro lado da linha, que não se queria identificar...segundos depois, desligavamos...
...umas vezes eu, outras vezes a pessoa do outro lado.
No início, 5 a 6 vezes por dia, 2 a 3 vezes de cada vez...


de tal forma que lhe decorei os horários...ficava à espera, olhando incessantemente para o telemóvel...esperançosa. 
A sequência acontecia  compassada no dia,... 8.20/30h da manhã tocava a primeira vez, depois por volta do 12.40h, 14.30h, às vezes 16.00h, às 19.00h e por fim às 22.40/50h....muito raramente por volta da meia-noite. 

Os horários, desvendavam algumas das rotinas de quem não se queria anunciar...
Acordava cedo e pretendia acordar-me também. De seguida trabalhava o resto da manhã sem tempo para estranhos hábitos...Chegada a hora do almoço, lembrava-me que eram horas de almoçar....
De tarde, eu imaginava que deveria ter horários menos rígidos ou menos disciplinados, se bem, que foram vários os dias em que ligava apenas às 14.30h para dar início ao período da tarde e depois apenas por volta das 18.30h....constatava...Outras vezes, recebia uma chamada por volta das 16.10h  e  voltava a tocar apenas no dia seguinte.
Deixei de atender durante uns tempos.
Este era o ritual que o meu telemóvel tinha de há três semanas para cá. Atendi pontualmente...Na verdade, não tinha o hábito de atender chamadas anónimas, mas alguma coisa me dizia que estas, devia atender,!!!!!....era, como se tivesse deixado, que os sentidos conduzissem a minha vida ou a  minha existência....e deixei mesmo!!!!!...

No início julguei ser alguém que me conhecesse e que me queria falar...Mas, na verdade, quando atendia....verificava, que afinal não tinha coragem ou, não sabia o que dizer...Depois, achei que era alguém que queria apenas ouvir a minha voz, mas não queria ser ouvida....apesar de não fazer sentido, porque a minha voz não tem um timbre especialmente bonito... 
E o que haveria eu de ter, para dizer a alguém que só ouvia do outro lado e não falava...!!!??!!!!
Ainda assim, coloquei a hipótese de desenrolar um monólogo de voz doce...mas desisti. 
Cheguei a pensar mais tarde, que pretendia apenas aborrecer-me,.... ou, porque, eu própria a tivesse aborrecido, ou por outra razão qualquer que não consigo considerar...Mas, também esta hipótese caia por terra, porque as pessoas que conheço e me conhecem sabem que resolvo tudo com uma boa conversa...sem esconderijos...

Concluí então, que isto só poderia estar acontecer vindo de alguém que não me conhece de facto... É difícil pensar pelas cabeças dos outros e considerar todo um universo de possibilidades, que certamente me transcendem em raciocínio...e, mais complexo ainda, é tentar adivinhar o que as motiva a fazer telefonemas a alguém, sem nunca dizer nada...

Os dias passavam marcados essencialmente pelas chamadas de ninguém,  que me queria fazer notar que existia, tanto assim, que me ligava...e eu registava, cada chamada na minha memória e na memória do meu telemóvel para a posteridade. 

Alguns dias depois, comecei a notar algumas ausências em determinados horários, as chamadas começavam a escassear, ...os primeiros quinze dias tinham apresentado este ritual...Fazia  a cronologia dos acontecimentos telefónicos e notava com uma tristeza estranha de explicar, que eram cada vez menos...Sentia-lhes a falta... 

Continuava a receber, mas agora, já sem regra nenhuma....
De manhã, não me acordavam pelo que adormecia, ...não almoçava, porque ninguém me lembrava a hora do almoço, ....não lanchava e havia dias que ninguém sequer, me dizia Boa Noite, trrrinntando...Havia dias, que só me acordava.....havia outros, que me lembrava que era hora de dormir e no dia seguinte me dizia, que era hora de almoçar....
Mas, não havia dia que não tocasse...Perdi as rotinas, baralhei os hábitos, comecei a ficar confusa e sobre tudo entristeci...

Percebia, que aos poucos, a pessoa perdia a vontade inicial que tanto a determinara semanas antes, a ligar para mim ...ou para ouvir a minha voz, ou até admito a possibilidade de me querer aborrecer...mas a verdade, é que escasseavam a cada dia os telefonemas e o nº de toques...  

Sofia, sofria com este acontecimento. Vivia sozinha, havia muitos anos e nunca fora uma mulher de muitas amizades nem no trabalho nem na vida, não tinha família nem namorado, nem sequer um animal de estimação...Vivia acompanhada apenas da solidão e de personagens e personagens que se amontoavam em prateleiras espalhadas por toda a casa. Nenhuma delas saia da sua história ou tinha o hábito de lhe perguntar porque estava triste, quando estava triste, ou porque estava alegre quando estava alegre ...se precisava de ajuda,... ou se queria desabafar alguma preocupação.

Sofia, habituara-se a viver só, sem partilhar nada.
Lá no fundo, sentia vontade de o fazer, de ser igual aos demais nas virtudes e nos defeitos, mas não tinha com quem...um amigo, uma amiga, um namorado...

Quando surgiram os telefonemas anónimos, alimentou a alma e a esperança...de ter alguém por companhia, mesmo que fosse apenas para falar ao telemóvel...

Perdera-se dos anos e os anos haviam se perdido dela. Quando se autorizava a sonhar, acreditava que um dia, alguém viria na sua direcção, uma outra metade de si...confiava cegamente no destino e no seu futuro, apesar deste se lhe apresentar cada vez mais curto.
O que poderia parecer aos olhos de todos estranhos hábitos, eram para ela uma forma de companhia e uma possibilidade de realizar sonhos...
Mas na verdade, a sequência dos acontecimentos indiciava que um dia os telefonemas anónimos iam terminar para tristeza sua...

Um dia, fui surpreendida e ouvi uma voz masculina, dizendo: 
- Eu amo você... Eu amo você...para se calar de seguida.... aquele timbre, não lhe era completamente desconhecido...
Não consegui dizer nada, faltou-me a voz...


sábado, 9 de outubro de 2010

O céu desaba...e as nuvens aplaudem

O céu desaba...chove muito...chove bastante...

o céu está carregado, as nuvens são densas ...
De tal modo, que olhando para elas percebo que vão precisar de muito tempo para ficar aliviadas, mais leves, mais sorridentes...

Faz algum tempo que as sentia pesadas,
cheias,
a transbordar...
Mas não haviam meio de rebentar.
Passeavam por cima da minha cabeça,
de lá para cá e de cá para lá, impacientavam-se...
sem saber que destino tomar,
confusas, confundidas engoliam um pouco mais
e tornavam-se ainda mais cinzentas,

como se não bastasse, o meu amigo vento apareceu
vinha forte, cheio de força
soprava igualmente zangado
por cima de mim...
Uivava alto, sem misericórdia
empurrava as nuvens umas contra as outras
como se as quisesse espremer
até que gritassem,
gritassem alto,

,,,mas fui eu que acabei por gritar

PAREM, PAREM QUE ME ESTÃO  A MAGOAR!
Dizia eu, cá de baixo quase esmagada por elas.

Sem dó, sem piedade ou qualquer tipo de compaixão
nenhum me ouviu...

Percebi em poucos instantes, que precisavam desabar em cima de qualquer cabeça,
não interessava qual...e, porque não na minha!
Teimava e revolvia as minhas ideias em turbilhão e perguntava-me, porque me tinham escolhido?
Não entendia...
com tantas cabeças por aí, e algumas delas, responsáveis certamente, por toda a agonia sentida pelas nuvens e a raiva espelhada no rosto do vento, porque seria a mim que pretendiam esmagar????!!!!

Enquanto me questionava...
em poucos minutos, o vento e as nuvens comprimiam-me contra o chão,
a chuva forte, que não deixava ver nada através de si,
apagava o rasto e tornava-se cúmplice...
Começou a trovejar... ninguém me ouvia gritar

e depois de esmagada, sucumbi...

as Nuvens e o Vento, ficaram aliviados...finalmente.
As Nuvens tinham agora outra cor, mais brancas e mais leves,
o Vento tinha ido embora à sua vida...
Continuara magoado e desconfiado...abrandando a ira momentânea...
As nuvens confundidas e aliviadas, sem rumo, partilhavam o céu, à deriva...

E eu...eu, abracei a vida de novo, num outro estado...entristecida, porque eles quase, que eram meus amigos...

sábado, 2 de outubro de 2010

Quando nascer de novo...


Quando nascer de novo...
não vou voltar a ser mulher, 
nem homem,
nem pássaro, nem golfinho,
nem Sol, nem mastro,
nem realidade, nem vertigem,
nem dor, nem pesar,
nem mágoa, nem pranto,
nem sombra, nem lágrima,
nem pó, nem grão,
nem Mar, nem chão
nem fado, nem canção

acabei de decidir,
vou ser um livro...

(vou nascer no meio dos livros...)

...No fim do tempo, numa boa hora, as águas vão rebentar e vou brotar de algum ventre materno... vou nascer de novo, mas desta vez numa biblioteca, no meio dos livros...e tornar-me-ei um deles...

vou ter capa, sem que ninguém me acuse
vou ter folhas como as árvores, sem secar
vou ter letras impressas no corpo, sem que ninguém me olhe de lado
vou sobre uns e com outros, sem ser classificada
vou andar de mão em mão, sem ser acusada
vou estar nas montras à venda, sem que seja olhada com luxuria

vou ser de papel...

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...o ambiente é de delírio, a emoção prolifera por entre os presentes...vai nascer um livro novo.... é sempre este o ambiente quando está para nascer um livro novo.... em suspense encontram-se inúmeros autores e personagens sonhadas, que assistem aos nascimentos de quem um dia se metamorfoseou... 

...clássicos e contemporâneos aguardam ansiosamente o nascimento... Stendhal, Victor Hugo, Miguel de Cervantes, Garbriel Garcia Marquez, Herman Hesse, Dostoiévski, Emile Zola, Emile Bronte, Dante Alighieri, Machado de Assis, José de Alencar, Bocage, Fernando Pessoa e heterónimos, Shakespeare, Homero, Joyce, Kafka, Mário Quintana, Jorge Luis Borges, Melville, Carlos Drummond de Andrade, Mário de Andrade, Netzsche, Antoine de Saint-Exupery, Paulo Coelho, Vinicius de Moraes, Clarice Lispector, Orwell, Virginia Woolf, Daniel Defoe, Chuck Palahniuk, Sófocles Jung, Alexandre Dumas, Pablo Neruda, Tolkien, Agustina Bessa Luís, Alberto Braga, Stieg Larsson, Augusto Cury, Bento da Cruz...
viverei numa biblioteca e serei um livro, ...multiplicar-me-ei em histórias de sonho...de guerras...de vidas...de amores...e desamores...de aventuras...

...deixarei de ser quem sou para interiorizar cada  história, cada personagem ...vou viajar pelo mundo em páginas e páginas de letra impressa, vou viajar no tempo de páginas amarelecidas pelo pó,... vou sentir a curiosidade e a expectativa inicial de um livro que se começa a ler...vou sentir, ao canto de cada página, a saliva de dedos que me tocam para me desfolhar na curiosidade de ver como acabo, vão-me devorar...
...e vou correr o risco de ser posto de lado antes de terminar, porque não consegui a empatia de quem me acolhe. As folhas e folhas que vou ter, vão ficar embriagadas de tantas letras e vão formar palavras e emocionadas construir frases no empenho de uma história alucinante ...

esquecer-me-ei de mim enquanto Ser...vou ficar calada para sempre, para que me oiçam com atenção... vou ter sempre dentro de mim a enfeitar-me, marcadores coloridos, de papel, de plástico, de metal, de prata, com pedras coloridas ou preciosas...
...esquecer-me-ei de mim e deixarei de falar, de me vestir, de comer, de beber, tarefas cansativas de rotinas urbanas sem precedentes...

e entre livros, grandes e pequenos, fantásticos e didácticos, a cheirar a novo ou antigos, ...deitar-me-ei ao seu lado numa estante ou numa qualquer mesa de cabeceira que me acolherá depois de umas mãos...e feliz, vou aguardar que me voltem a pegar, tantas vezes, quantas o entendam necessário até satisfazer por inteiro a curiosidade ou o momento de alguém...

...transformar-me-ei em múltiplas personagens imaginadas por cada um dos escritores que me escrevem... vou ver rir, vou ver sofrer, chorar, amar, amar sem pensar, naufragar, viajar, prometer, desafiar, não cumprir, imaginar, desmentir, seduzir, permanecer, desencontrar, subestimar, enlouquecer, caracterizar, repetir, sacrificar, analisar, cristalizar, surpreender, acautelar, proporcionar, ...no fundo, quero dizer viver...e amar, amar, amar...

...e assim, serei eterna na minha forma de estar...


quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Exclusividade ou protagonismo...



...a discussão terminara, ...Maria saia magoada e António ficava entre aquelas 4 paredes do hotel de subúrbio com meia-dúzia de quartos pintados de verde água, em que uma barra cor de rosa aumentava o ridículo da decoração. Por todo o lado, havia folhos e florinhas miúdinhas, perfiladas lado a lado que atavam aquelas paredes umas ás outras sem culpa aparente. Paredes, que inúmeras vezes testemunharam os encontros dos dois.

Fechou a porta atrás de si, amargurada com o desfecho daquele encontro. Não era assim que o tinha imaginado...Sempre que combinavam encontrar-se, ela pensava, minunciosamente em cada detalhe. 

A escolha daquele hotel, nada tinha a ver com o sentido estético dos dois, mas tinha sido a opção possível e que haviam tomado em conjunto, após dois anos de encontros fortuitos no carro, no campo, longe dos olhares alheios, que teimavam em pousar sobre eles onde quer que entrassem, pela felicidade que irradiavam.

Eram bonitos. Talvez por isso, brilhavam por onde passavam. Maria, tinha uns lindos cabelos castanhos compridos, uns olhos quase verdes e doces, amendoados e um corpo torneado de curvas. António, era igualmente moreno, ligeiramente mais alto, de cabelo liso e um sorriso de fazer inveja.

No início, em que uma paixão arrebatadora ainda lhes tirava o sono e o discernimento, não havia tempo a perder, todo era pouco. Previam então, que se iriam encontrar muitas vezes, pelos menos nos anos seguintes e isso obrigava-os a procurar um espaço, adequado à paixão que sentiam um pelo outro e que até aqui, tinha sido circunscrita ao automóvel dele.      

Foram muitos os momentos, em que esqueciam as suas oficiais vidas e se entregavam para se perderem. Maria amava António e António amava Maria, sem dúvida.

Gostava demais daquele homem, para alguma vez pensar, que ele um dia lhe ia sugerir a exclusividade. Por várias vezes tinham abordado o assunto, sem nunca ouvir da sua boca qualquer opinião séria a esse respeito. Brincava sempre com a situação e deliberadamente desviava as atenções para as graças ou piadas que tinha facilidade em fazer pelo o bom o humor que o caracterizava. António, era um homem gracioso e sedutor, enquanto não se sentia obrigado a expor as suas verdadeiras opiniões a respeito do que quer que fosse. No entanto, quando assim era necessário, o seu rosto transformava-se, tornava-se rude de feições perdia a graça e a sedução, para se tornar frio e racional. Poucas vezes ao longo dos anos, Maria o viu com aquele semblante que não lhe deixava saudades.

Era a primeira vez que discutiam...desde, o início de tudo.

...

Acabara de se sentar ao volante do seu carro e recordava agora, andando para trás no tempo e viajando pelas memórias de bons momentos entre os dois, que a complexidade da sua vida e as opções que tomou no passado, eram manifestamente incompatíveis com os desejos de ambos,...mesmo sem futuro.

Maria, não permitia a homem nenhum que lhe pedisse a exclusividade, porque ela tinha  escolhido para si, que a sua vida seria pautada por protagonismo.


domingo, 26 de setembro de 2010

Lisboa abandonada ao silêncio...




Lisboa estava agora abandonada ao Silêncio... 

O Agosto, levara consigo todos os transeuntes...os homens, as mulheres e as crianças, as companhias com quem partilhara sonhos comuns daquele ano...os amigos, os amantes, os apaixonados, os poetas, os pintores e os músicos, os escritores e os seus leitores, entre tantos...cansados que se sentiam de um ano intenso de rotinas e cheiros agri-doces, sentidos por Lisboa. Cheiros estes, agora mais intensos do que antes, pela audácia das gentes que a habitavam e viviam nela durante a maior parte do seu tempo, onde não se podem esconder, nem esconder nada...

Tinham ido todos embora...

A saída sazonal, marcava o momento e Lisboa sentia-lhes a falta. A falta de todos aqueles que lhe percorriam o corpo e a alma, calcorreando os becos, as vielas, as ruas, as avenidas, as colinas de forma silenciosa ou de forma estridente e às vezes até desconcertante...que faziam Lisboa corar, havendo uns que lhe deixavam mais saudades que outros.

Olhava em volta e sentia-se sozinha...Na solidão daqueles dias, restava-lhe à noite a Lua por companhia, o Tejo e o silêncio. Uma vez por outra, juntava-se a nós um sem abrigo que não tinha tido nenhum convite para ir a banhos de mar e sol, numa qualquer estância de praia do nosso país ou  no estrangeiro. Passávamos horas, deliciados a ler.

Outras vezes, aproveitávamos para colocar a conversa em dia e admirar o Silêncio. O Silêncio era de todos o mais recatado, o mais calado, nunca proferia palavra, limitava-se a observar.....e, a Lisboa, bastava sentir-lhe o olhar e mergulhava no seu enternecedor corpo envolvente e deixava-se cair por entre os braços e dedos do Tejo, em silêncio... Que bons, que eram estes momentos de paz...

Lisboa descansava...e a Lua, o Tejo e o sem abrigo em paz, ao som do Silêncio, aproveitavam para fazer o mesmo.

Fomos acordados pelo barulho das gentes da minha terra de volta às rotinas. Desfeitas as malas e barrigas cheias de sonhos realizados pela metade,... atropelavam-se com saudades de casa... e Lisboa alegrava-se ao vê-los chegar...

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Across the Universe...



- Há vícios estranhos...estranhos de bons, bons de estranhos, bons e estranhos, estranhos, bons...

...e, Pedro não se intimidava, por isso. Sempre que desejava contemplar os pássaros azuis que se perdiam por se encontrarem tão longe...assim o fazia, sem preconceito.

Pedro tinha este vício havia pouco tempo, talvez por isso, o estranhasse... aquele vício vindo não sei de onde, que lhe aconchegava o corpo. Umas vezes, pela manhã, outras vezes à tarde ou até mesmo à noite procurava-os no céu, azuis como gostavam de ser...

Junto com eles em bando, surgia por entre as nuvens uma menina que trazia consigo um balão vermelho...e que os guiava até Pedro, porque tinham perdido o Norte.

Outras vezes encontrava-os no mar, onde o céu estava reflectido. 

Sabia, no entanto, que nem sempre os encontrava aumentando-lhe o desejo e a saudade  que tomava conta dele. Estranhava-lhe as ausências,  mas não tinha outro remédio senão esperar que aparecessem para lhe fazer brilhar o olhar.....compreendia-os, porque eram pássaros selvagens e livres, como o próprio Pedro.


Sempre lhe tinham ensinado que aqueles olhos azuis raiados, não podiam contemplar o que quer que fosse... não fosse o céu, o mar ou os pássaros leva-lo com eles no seu azul, mas Pedro "sofria" desde pequenino de uma curiosidade enorme que aproveitava para desafiar o Mundo. Foi por culpa dela que encontrou todo este saber de homem feito, que aprendera o nome de todos os mares e estrelas muito antes do tempo, que desafiara muitas vezes a vida sem lhe pedir nada em troca a não ser o Conhecimento. E, numa ocasião desafiou o destino...

Há vícios que valem a pena, pensava para si... e este é um prazer doce, que o faz viver a cada vez e lhe dá vida...

Até hoje, não se arrepende...aprendeu a ver azul, pássaros, balões e tira prazer do seu maior vício... across the Universe.


sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Corpos, de ventres planos...




 "Encandeiam-me os corpos de ventres planos..."

...neles apetece sonhar e mergulhar sem remorsos,... sentir-lhes a pele macia..
...mergulhar nos seus umbigos redondos e convidativos, para dançar uma valsa estonteante...


...como cachorros acabados de nascer, sem força nas patas...
que apenas avistavam uma névoa e se guiavam pelo cheiro na esperança de saciar a fome... procurávamos o conforto e o aconchego de um leito, com um corpo estendido...

Ainda hoje, enrolas o ventre sobre ele e apareces em espiral junto de ti... e bailas
ao sabor das ondas dos corpos sagrados
e delicias-te com aquele cheiro mágico,
de algodão doce que te leva para muito longe....ou para muito perto, das nuvens.

Por cima de nós, sobrepõem-se paisagens,
camadas marcadas pelo passado,
vidas inteiras de holocausto que nos lembram, a existência do amor e da vida...

...e as marcas, dos beijos e dos desejos infundados que sentimos uma vez, enquanto loucos...

Juntos rompemos madrugadas solarengas e frias
de portões altos e paredes fortes
e buscamos um no outro, as amarras de papel de muitas cores...

Foi no teu ventre liso que aprendi a esbracejar
e a voar, dentro e fora de mim...
onde encontrei um pássaro pousado num pinheiro manso,
adulto, capaz de cuidar de alguém...

Meu Deus, como me encandeiam os corpos de ventres planos...

 

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A harpa de Eurico...



...

2º Acto - As lembranças (1)

Eurico Cuneo do outro lado da vida, formulava desejos de sonho em lugares românticos...

Ao som do frio e do calor das suas notas, desejava abraça-la...  assim que pudesse. Pretendia envolvê-la  nos seus braços e adormecê-la para sempre junto de si... sentia-lhe a falta. 

Era tão grande a saudade e a admiração que tinha por aquela antonomasia morena, de carácter  doce, que às vezes, imaginava que tinha asas e podia voar azul ao som da sua harpa...e, voava mesmo...flutuava, dedilhando... Apaixonado, em tradução literal recordava abendmusik....

Fim do 2ºActo.

Interlúdio

3ºActo - As lembranças e o princípio da agonia ...(2)

...ouvia o Ré no sistema alfabético como se ela lhe cantasse ao ouvido, baixinho, sussurrando nota a nota e perdia a respiração e o fôlego...

Accelerando, não sabia mais o que fazer para acalmar aquela saudade e aquele desejo semmmmmmm fim. Aquela lembrança dorida, que tanta alegria lhe trazia e lhe aconchegava a alma por instantes salteados... Lembrava os beijos, os mimos, os colos trocados... os risos, as carícias, os afagos e a ternura imensa dos poucos e curtos momentos, que uma vez passaram juntos...

... as luzes apagam-se, o pano cai e a plateia cristaliza...

Momento do reencontro. Cenografia: sem tempo, sem horas, sem lugar, para poderem viver finalmente um amor verdadeiro, intenso e serem felizes...
No quarto-muro....deixaram o teatro da vida, para viver de verdade...

...até, que o dramaturgo dê início a um novo processo criativo reinventando a história.

FIM


quarta-feira, 11 de agosto de 2010

de volta... de umas férias culturais..




...voltei, de umas férias culturais....cheia de saudades do  calor, de ouvir falar português... e o que é que encontro....Hot in the city...